sábado, 18 de abril de 2009

Um depoimento no mar ou Onda que vaga devagar



NOTA DE AGRADECIMENTO A UMA AMIGA


Esta semana fui convidado por uma amiga a dar um depoimento em sua faculdade de Comunicação Social a respeito de minha história de vida e minha visão sobre os movimentos LGBT’s. Deixo aqui o registro do meu agradecimento a ela, Camila, por oportunizar este convite e, ao mesmo tempo, por se permitir adentrar pelos meandros do conhecimento a respeito do que é o outro e da diversidade humana. A ela, que conviveu comigo e participou de fases muito difíceis pelas quais tive a graça de passar e superar, deixo aqui o meu agradecimento. Deixo também um grande beijo às meninas de seu grupo que tão atenciosas se permitiram ouvir minhas palavras com tamanha valorização. E por conta do óbvio e da evidência deixo os motivos que a levaram a realizar o referido convite que, aliás, promoveu em mim um sentimento de satisfação e de dever cumprido, como poucas vezes já senti em toda a minha vida. Um pequeno ensaio de crônica ilustra o episódio. Espero que gostem.



Um depoimento no mar ou Onda que vaga devagar


Eram poucos os minutos disponíveis para resumir toda uma vida. Achei que não fosse conseguir, o que deixou meus nervos à flor da pele. A sala lotada promovia antes da apresentação do grupo um ruído ensurdecedor, de alguns setenta alunos pouco disciplinados que, sem muita ordem, tentavam se organizar mutuamente para a apresentação dos grupos. Previamente me encontrei com o que me convidou, por volta das dezoito horas, e esclarecemos as eventuais dúvidas que o tema teria gerado ao longo da pesquisa e, assim, partimos para a sala de aula da universidade, à espera da chegada do professor. O mestre, atrasado, chegou. O grupo das meninas foi o segundo a se apresentar, e eu, convidado, era espreitado por dezenas de olhares que não entendiam o que eu estava fazendo ali. Alguns olhares femininos sugeriam algum interesse. Por parte delas, claro. Sem necessidade de modéstia, afirmo isto sem ter percebido, pois foram minhas anfitriãs que me informaram aos cochichos sobre o que a minha presença enigmática estava causando aos demais. O mistério fora desvendado ao final da apresentação das meninas, que, aliás, foi belíssima: todas de preto com plumas e mapuás coloridos nos pescoços lânguidos e curiosos. Nem o professor atrasado foi poupado e recebeu um colar de plumas roxas. O preto representava o luto pelas estrelas da apresentação; o colorido, a alegria eterna, apesar das muitas mortes e violência ocorridas todos os dias neste país. Então me chamaram à frente, como uma testemunha ocular, como alguém que falava de dentro o que de fora era pesquisado. O silêncio falava. Olhos, muitos olhos, prestavam atenção, surpresos, a uma história de vida, resumida aos prantos em pouquíssimos minutos. Um mar de gente atenta ao que era novo e diferente. Um mar cuja maré era aguçada por apenas uma gota, uma gotinha que, de alguma forma, suscitava tímidas ondas no oceano que também era seu. A curiosidade era latente. A desilusão – de algumas universitárias – também. As palmas encerraram o depoimento, sons que provieram, inclusive, de alguns estudantes que debochavam e ironizavam a apresentação do seminário logo em seu início, como se o assunto tratado abordasse algo absurdo ou de outro mundo. Logo surgiram duas perguntas, e surgiriam muito mais, não fosse o corte dado em função do tempo que já urgia. O professor queria ouvir mais. Talvez se ele tivesse chegado mais cedo... quem sabe não teríamos mais tempo? É claro que me sinto honrado pelas palmas, mas elas não deveriam ser feitas a mim. Metaforicamente, sim. Mas na prática, não deveriam. Por isso, repasso as palmas aos muitos dos de mim, outros tantos como eu, que não tiveram a oportunidade de se expor e de se impor, diante de uma classe de burguesinhos brancos universitários preconceituosos, em maior ou menor grau. Saímos contentes da sala, tendo antes sido convidado por um outro grupo para auxiliar em uma das últimas apresentações, afinal eu havia comentado que era professor, e elas, as outras meninas, pouco ou nada sabiam a respeito do tema de seu trabalho. Queriam ajuda... por que não? Comemoramos no shopping da universidade o sucesso da apresentação. E, para minha surpresa, fui atendido na lanchonete do shopping por um de meus alunos, com quem, aliás, tenho travado grandes e produtivas discussões a respeito do tema que fora abordado no trabalho de faculdade das meninas, aluno resistente, mas que defende suas idéias (diferentes das minhas), sem perceber que – ao passo em que resiste e discute – permite-se refletir e pensar por muito mais tempo sobre assuntos polêmicos e necessários, os quais seus pais não tiveram, na certa, a paciência e a coragem de lhe abordar. Se fui por um dia metáfora social diante de uma platéia pouco informada sobre o diferente, mas aberta ao novo, meu aluno foi – aliás, tem sido – a metáfora da platéia. Acho que as coincidências não são por acaso. Nunca são. Elas promovem o despertar para a mudança e anunciam que o caminho que escolhemos, de alguma maneira específica, em um mar gigantesco de possibilidades, é, senão, uma onda com um sentido muito especial de ser e de vagar.



“Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”

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“Tudo muda o tempo todo no mundo”

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“Não adianta fugir nem mentir pra si mesmo”

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“Há tanta vida lá fora”

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“Como uma onda no mar”



2 comentários:

  1. Very nice Fotos!! Great Job!!
    nice music!!
    my site

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  2. É realmente você descreveu excelentemente aquele dia!!! Adorei... Mais uma vez obrigada pela homenagem, fico feliz em saber que este dia também foi especial pra vc.
    Bjooooo...

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