quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Um Ano Novo com 25 Cabides!



Última postagem do ano. Falta menos de uma hora pra eu partir para a Ilha do Governador, onde passarei o Reveillon. A postagem de hoje é mais ou menos uma reflexão sobre o que significa a comemoração do Ano Novo. Este ano resolvi fazer diferente: embora a tentação fosse grande, decidi não ir para Copacabana. Quero mudanças na minha vida.
Como dizia Gandhi, “seja você a mudança que você quer ver no mundo”. Coloquei a idéia à prova no começo de dezembro e resolvi transformar a minha casa. Pequenas mudanças que não vão muito além do campo da estética (não sei porque as pessoas mais conservadoras, religiosas e ranzinzas não dão valor à estética... eu acho o belo algo divinal! Acho que Deus está no que é belo, inclusive na capacidade que deu ao homem de buscar o que é bonito, mas enfim...). Nova pintura na sala, que inspirou uma nova mobília, que inspirou uma nova TV, que inspirou a pintura do teto dos demais cômodos, que inspirou a reforma dos quartos, e a coisa ainda está caminhando... (Interrupção: minha mãe acabou de chegar no quarto me mostrando o novo corte de cabelo: cortou tudo, curtinho, está linda, um charme! Continuando: ...que inspirou minha mãe a cortar o cabelo, que inspirou... que inspirou... que inspirou...).
Sendo eu a mudança que quero ver no mundo, decidi renovar o meu quarto! Um quarto bonito não cabe tanta coisa velha! O quarto está às traças: tantos objetos, tanta lembrança, tanta coisa antiga, que não cabe mais nesse cubo dormitório (faltam 40 minutos pra eu partir pra Ilha do Governador). Comecei a mexer no guarda-roupa anteontem e consegui esvaziar a metade dele e tirar de lá tudo o que não mais fazia sentido na minha vida. Como foi difícil me livrar do meu passado mais preservado do ponto de vista material! Vocês não têm idéia das coisas que eu encontrei: um jornal de quase sete anos que falava do campus da minha universidade, cujo curso já concluí há três anos; uma caixa de lembranças que, depois de revisada e revirada, resumiu-se a um conjunto de clips coloridos que coloquei no meu porta lápis; roupas com motivo xadrez que eu nem sei o que faziam lá dentro; uma cesta de café da manhã que ganhei depois de um mês me enrolando a um flerte, flerte este que não durou uma semana depois de ter recebido a cesta (não foi intencional, viu?); uma bolsa personalizada que me foi presenteada pelo meu primeiro amor, e que eu preservava até hoje por causa da foto que nela estava colada (livrei-me da bolsa e guardei a foto); um bolo de notas de cartão de débito; perfumes velhos com dezenas de amostras grátis já há muito passadas; centenas de papéis, provas velhas, revistas, trabalhos de faculdade do primeiro período (e pasmem, não eram meus! Eu acho que eu peguei pra distribuir de volta aos meus colegas dos quais nem me lembro mais os nomes nem os rostos!). Tanta quinquilharia! Como foi difícil selecionar...
Do outro lado do guarda-roupa, não tinha muitos objetos; o que tinha foi lançado ao vento. De um modo geral, o armário, que guarda minhas roupas, precisava de espaço, precisava respirar. Com tanta roupa sem usar, eu já estava sufocando o pobre do armário, que já suava de tanto me implorar pra dar um jeito na bagunça, tanto quanto minha mãe, que não fazia diferente há mais de seis meses pedindo pra arrumar a zorra que esteve este cômodo. Livrei-me de uma camiseta que comprei em 1998! Lembro-me como se fosse hoje, indo à C&A porque queria uma camiseta no estilo dos jogadores de basquete. Doação! Umas blusas que comprei há anos, porque queria ser sóbrio, usar cores pastéis, neutras, blusas lisas, tanto quanto minha fase pré-aceitação. Doação! Meias que já não cabiam no meu pé. Doação! Bolsa que comprei para ir à faculdade. Doação!
Entre tantas outras roupas mal, pouco ou nunca usadas! Não é possível que prendi tanta vestimenta dentro do meu armário, justamente eu, que tenho horror a armário e a tudo e todos que se mantêm dentro dele. Mas eu mantive. Durante um tempo comecei a me sentir culpado pelas pessoas que morrem de frio, pelas ruas da cidade, pelos desabrigados de Santa Catarina, que perderam todas as suas vestimentas, pelos sem-teto, pelos sem-terra, pelos sem-roupa... e isso me deu um vazio! Mas um vazio tão inspirador! Tão grande quanto o vazio que ficou entre cada cabide que restou no móvel. Quanto espaço! Louvores ao vazio! Meu prêmio foi ver que não precisava mais comprar cabides, pois já estava até conferindo o preço mais barato. Como tudo o que é relativo, depende do ponto de vista: não faltavam cabides, mas sobravam roupas, muitas roupas! Pra quê? Pra que guardar o passado de maneira tão egoísta? “Essa blusa não dou, Fulano me deu”. Pra quê? “Essa calça eu nunca usei, está novinha...”. Pra quê? Em suma, o resultado da reforma foram vinte e cinco cabides! Todos liberados! Além deles, inúmeros espaços vazios, prontos para receberem de 2009 a inovação que o ano pede: 2000 INOVE! O quarto ainda está uma bagunça, Faltam 25 minutos para eu ir para a Ilha do Governador. Preciso colocar a maionese no salpicão. O tempo corre, Gustavo está me esperando. Não posso me atrasar. Que 2009 me traga muita pontualidade. E também cabides, para pendurar em cada um, a esperança de um mundo melhor. Não pensem que estou confinando a esperança de melhorar o mundo dentro de uma mobília. Aos pouquinhos a gente precisa aprender a tirar do armário tudo aquilo que pode ser útil e feliz fora dele. Que venha o Ano Novo!



sábado, 13 de dezembro de 2008

Aos meus Alunos!



NOTA DE AGRADECIMENTO AOS MEUS ALUNOS



Nem sei se devo chamá-los assim, "alunos". Esta palavra vem do latim alumnus, ou seja, "a-luno", "sem-luz", aquele que não tem a luz, a luz da experiência, do conhecimento, da vida... Eu, porém, discordo das raízes latinas deste vocábulo e, por este motivo, resolvi postar aqui esta mensagem de agradecimento a todos vocês, meus queridos estudantes iluminados e iluminadas. Vocês abrilhantaram o meu ano, vocês são luz, vida, calor... Às vezes calor demais, confesso! Quando resolvem esquentar minha cabeça, sai de baixo!!! Mas o quanto eu aprendo com vocês a cada dia, a cada ano.

Eu tenho o enorme prazer de compartilhar durante o ano com todos aqueles que amo (amigos, amores, amantes...) todas as minhas experiências que passo com vocês. Mesmo aquelas que não foram tão legais, que trouxeram alguma dor de cabeça que tenha me tirado do sério. Isto não significa que este tipo de experiência é "ruim". Tudo o que passo com vocês contribui para meu amadurecimento, para meu crescimento, e na verdade, vocês são meus professores, são vocês os meus patrões, os meus "chefes"... ehehehehe! É para vocês que me dedico e me esforço, é pra vocês que trabalho o ano todo, e espero, humildemente, que eu tenha contribuído para a vida e formação de cada um de vocês. E quanto às experiências, tem aquelas memoráveis, aquelas fantásticas que não dá mesmo para esquecer. Lembro da gente brincando de "escravo-de-jó" no começo do ano, fazendo altos jogos, montando maquetes maravilhosas... como esquecer aqueles castelos lindos, aqueles feudos que só vocês conseguem fazer!? Cantar o alfabeto hebraico, ver vídeos no laptop, brincar de fazer múmia no pátio, encenar a Conquista da América, tudo isso tá guardado no meu coração e memória. Sem falar o espetáculo que foi ensaiar e apresentar aquela coreografia no final do ano, em referência ao Dia da Consciência Negra, que também foi lembrado com aquelas maquetes lindíssimas sobre os quilombos. E aí, até agora vocês não responderam: "Vocês conhecem Zumbi?" hahahahaha Tenho certeza que agora conhecem!

Aos meus queridos estudantes do Ensino Médio, fico muito contente em ter encerrado as aulas com a experiência de lecionar para pessoas tão questionadoras, tão críticas, polêmicas, desconstrutoras... Digo isto porque neste mundo de conhecimentos e vivências, é mais interessante desconstruir do que construir, perguntar do que responder, discutir do que aceitar. Ao povo do 2º Ano, gostaria de dizer que foi um desafio, pra mim, trabalhar com vocês todos os temas que abordamos, de aborto a racismo, de diversidade sexual à religiosa, discutir com vocês foi um aprendizado e tanto! Ao povo do 3º ano, faço uma dedicatória especial, porque não nos veremos institucionalmente ano que vem. Quero deixar meus parabéns, porque hoje é a formatura de vocês. Daqui a pouquinho vou me arrumar, senão chego atrasado, e eu não posso perder essa festa! Falta uma horinha só! Também pra mim foi um desafio trabalhar com vocês, fazer todas aquelas provas e simulados, incentivando a cada um a seguir carreira profissional e mostrando a importância de contruir um amanhã com um pouco mais de dignidade.
Estou feliz!

Sabe, é muito difícil ser professor, vocês não fazem idéia do preço que a gente paga por tentar fazer um trabalho diferenciado para vocês. O que tem de gente pra tentar atrapalhar, não está no gibi! Ser professor é uma das profissões mais bonitas, mas ainda a mais atrasada do ponto de vista da inovação, da transformação, da mudança. Sei que nós, professores, podemos mudar o mundo, e sei também que deixamos a desejar a vocês em muitas coisas. Peço desculpas aqui pelas minhas falhas, meus desacertos, meus insucessos, enfim.

Meu desejo maior é que a Educação do nosso país seja instrumento para a construção de um mundo melhor, para isso trabalho, para que a Escola seja o palco deste espetáculo, mas infelizmente hoje nós esbarramos em muitos empecilhos. Não posso deixar de expressar minha indignação contra toda a burocracia, todo o entrave burocrático, ou burrocrático, que atravanca a Educação no nosso país, ou no nosso Estado. Desejo que vocês encontrem daqui pra frente um mundo muito menos mesquinho, menos acomodado, menos falso, menos viciado, porque o mundo que a gente vive hoje, que reflete no nosso sistema educacional, é um mundo falido e vergonhoso!

Desejo também a vocês que jamais se transformem nesses profissionais fim-de-carreira, e que a inovação seja a alma de suas vidas, e que a dignidade de cada um seja alimentada pelo espírito de transformação, e não pelo comodismo de um salário mediano e um trabalho feijão-com-arroz. Infelizmente, muitos de nós sequer sabemos o que estamos fazendo de nossa profissão e de nossa vida. No final, quem acaba pagando são vocês. Mil desculpas pelas nossas falhas enquanto professores, funcionários e diretores!

Se vocês tiverem consciência do papel de vocês neste neste país, neste estado, nesta escola, estejam certos e certas de que vocês podem ganhar o mundo! E é isso que eu desejo e espero.

Por último, desejo a todos e todas, finalmente, FELIZ NATAL! Que esta data não seja apenas um símbolo festivo, mas a lembrança de que pouco mais de 2000 anos atrás, um Camarada nasceu para denunciar as injustiças deste mundo, as desigualdades, a falta de amor ao próximo, e por conta disto foi sacrificado em uma cruz. Independente de sua religião, que a mensagem do Natal possa refletir o que o nascimento de Cristo significou para a humanidade daquela e de todas as épocas, ou seja, a Transformação de Parâmetros, uma Revolução pelo Amor, a Mudança de Ponto de Vista, a Inovação do Saber, a Crítica aos Tradicionalismos, a Revolta contra as Injustiças e contra a Opressão.

A todos e todas vocês, um Ano Novo repleto de felicidades! Nos vemos em 2009!




E mais uma vez, obrigado! Vocês são os meus professores!





Com Amor,

Prof. Leandro


____________________________________________________________________
____________________________________________________________________

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Guerra civil é a pátria-que-pariu!


Quando das situações mais adversas e de difícil elucidação, é incrível como o ser humano se limita a circunscrever a explicação do mundo ao seu próprio umbigo, evitando refletir sobre realidades mais amplas e mais complexas.

Hoje saí do trabalho assim, com a face estarrecida diante de uma discussãozinha de fim de noite, depois de conversar com alguns de meus colegas de trabalho. Um deles advogou uma causa que me chocou bastante (uso aqui o verbo “advogar” porque o indivíduo se comporta como se já houvesse feito doutorado em Direito, mesmo que por ora seja um mero recém ingresso nesta faculdade). Eis o tema da discussão: o tráfico de drogas e as milícias. Como eu houvesse saído de lá com o estômago em náuseas, tenho que urinar aqui toda a carga eufórica que sufoquei, tendo tido a oportunidade de lançar à bexiga o que o estômago reteve. Mas o mijo sairá objetivo, com mira em apenas uma direção dessa grande privada que é a Internet. Eis o problema sobre o qual mijarei.

Um dos argumentos do ilustre doutor era estarmos no meio de uma guerra civil. Ponto final, fim do assunto: bonzinhos de um lado, mauzinhos do outro. O Rio de Janeiro é uma hecatombe descontrolada com feixes luminosos que são disparados aleatoriamente sem um destino certo, tornando cada um de nós vítimas da violência urbana, imersa e à mercê do narcotráfico.

Que o Rio de Janeiro está um caos, já sabemos, é quase um pleonasmo dizer que o Rio está violento. O Rio “é” a violência. Ele nasce violento, como a História mostra. Convém questionarmos “de que” violência estamos falando, mas não é chegada a hora deste assunto. Interessa-me, por enquanto, questionar a idéia de que vivemos uma guerra civil.

Não, meus amigos, não vivemos uma guerra civil. Por mais violenta que nossa cidade esteja. Vamos ao Aurélio. Guerra: “luta armada entre nações ou partidos; conflito; expedição militar, campanha; a arte militar, oposição”. Civil: “concernente às relações dos cidadãos entre si, reguladas por normas do direito civil; não militar; civilizado, cortês; indivíduo não militar, paisano”. Desculpem se estou às cegas, mas não consigo enxergar a questão do narcotráfico e das milícias na combinação dos conceitos acima. Talvez com uma ajuda mais profissional o nó se desfaça. Vejamos o que dizem John Keegan, editor de defesa do jornal "The Daily Telegraph" de Londres e Bartle Bull, editor internacional da revista "Prospect”:

"Existem três aspectos principais que definem uma guerra civil, cada um deles com diversos requisitos secundários. A fórmula básica é simples: ela deve ser uma "guerra", a violência deve ser "civil" e seu objetivo deve ser o exercício ou a aquisição da autoridade nacional.

A parte "civil" da definição significa que a luta deve ser conduzida dentro de um território nacional e deve ser efetuada principalmente pela população desse território, lutando entre si. Também deve envolver um grau significativo de participação popular.

Uma guerra civil também tem de ser uma guerra - o que o dicionário chama de "disputa hostil por meio de forças armadas". Essa definição exige batalhas e campanhas formais? Ou basta a luta entre facções ou regiões? Para nós, uma guerra civil exige líderes que digam pelo quê estão lutando e por quê, e um público que compreenda do que se trata - as diferenças e os objetivos.

A terceira condição principal, a autoridade, é igualmente importante. O motivo da violência deve ser o governo soberano: os combatentes devem tentar tomar o poder nacional ou mantê-lo. Vingança, lutas por direitos e crimes em massa não bastam".

Eu nunca soube que algum traficante quisesse ser presidente do país, tampouco que o objetivo do líder de uma boca-de-fumo fosse a soberania nacional. Tudo bem, a autoridade do Estado pode até estar em jogo, mas será que em âmbito nacional? Uma guerra civil pressupõe a população lutando junto, estando “com” os guerrilheiros, e não “contra” os combatentes. Existe um certo apoio populacional em uma guerra civil que se opõe diametralmente com o medo que nossa população carioca vivencia. Onde está a participação popular na “guerra civil carioca”? Ou alguém conhece alguma senhora mãe-de-família que fez cursinho no GPI ou no pH para aprender técnicas de balística aplicadas à guerra?

Mas o que eu acho mais interessante na citação acima é o fato de que uma guerra civil pressupõe a existência de líderes que digam pra que vieram ao mundo; exponham seus objetivos de modo que todos saibam por que cargas d’água eles estão se matando! Em suma, “líderes que digam pelo quê estão lutando e por quê, e um público que compreenda do que se trata - as diferenças e os objetivos”.

Eu gostaria muito que o Rio estivesse em uma guerra civil. Eu queria saber por que meu vizinho morreu semana passada, quando saiu de casa e não voltou. Gostaria muito de entender por que temo chegar em casa de madrugada, ou ainda, compreender os temores que sinto ao sair de carro à noite, correndo o risco de um assalto, um latrocínio, cometido por um desvairado qualquer. Me incomoda saber que esse desvairado não tem uma história, um porquê, um sentido. Ou será que tem?

É muito mais fácil reduzir um problema histórico de ausência do poder público a uma definição simples, dada por um conceito, tão limitado quanto qualquer outro: guerra civil. Eu acho que ficaria mais fácil se de fato eu conseguisse enxergar nesta sociedade as duas faces da mesma moeda, os grupos que estão em “guerra civil”. Mas nesta terra até a moeda é corrompida, e o lado que é dado aos salmões, satisfaz também os baiacus. Não vejo dois lados distintos lutando, mas grupos que se alimentam um do outro, ou alguém realmente acredita em brincadeira de polícia e ladrão? Este tempo já passou. Hoje os papéis se misturam. Quem deveria garantir a segurança se vende. O criminoso protege. É a cidade às avessas, que cada vez mais se corrompe sob as barbas da barbárie que é o capitalismo, onde o que vale, sempre, em primeira instância, é o dinheiro. A milícia é a tradução da corrupção do poder público, e o que mais me espanta é vê-la posar de herói nesse país de anti-heróis. Aliás, este país é uma fábrica de anti-heróis: de Cabral e seus genocidas a D. Pedro e seus escravocratas. De Vargas e seus torturadores a Fernandinhos Beira-Mar. De Tenório Cavalcanti a Zito e seus protegidos. Eu tenho nojo desse anti-heroísmo que mascara o mal pior (com toda a redundância que esta expressão traz) que nos está acontecendo.

Meu colega doutorzinho pediu uma explicação: “se não é guerra civil, é o quê?”. Eu respondo: “É a ausência por conveniência do Estado” somada ao “monstro do capitalismo que toma conta deste planeta”. O que vemos hoje é o resultado de anos e décadas de descaso do poder público. Se a favela é violenta hoje, não o foi o Estado quando privou a população dos direitos sociais, políticos e civis dos quais deveria gozar? E desde quando milícia é solução pro problema do narcotráfico? Pesquisas mostram que em cerca de 63% das comunidades onde existem hoje as milícias, não existia tráfico de drogas (entenda-se como tráfico de drogas um esquema mais ou menos articulado de negociação de narcóticos com base estabelecida em uma determinada localidade). Elas não eliminam o tráfico, mas se alimentam dele, quando não o substituem. O que é público, é público. O Estado não está à venda! A milícia é pior do que o tráfico, porque o tráfico não vai à Assembléia Legislativa, não se candidata, não ganha eleição. A milícia, sim. Ela é o Estado vendido. E se hoje pode parecer pouco pagar um policial de meia estirpe 10 ou 15 reais, para garantir a segurança da criançada, quanto não custará a sua vida daqui a 10 ou 20 anos? E quem controlará essa transação financeira fora da lei? Outrossim, deveríamos cobrar segurança de quem deveria fornecer, isto é, este mesmo policial, que é pago pra isto pelo Estado. Para isto pagamos impostos. E se ele não tem condições de fornecer, que briguemos para que ele o tenha. Mas é mais fácil pagar a propina institucional, não? O problema é que estamos criando as bases do leilão do poder público. Os 10 reais de hoje podem, a médio prazo, se transformar na metade do seu salário, ou da sua casa, ou da sua vida.

Você tem INSS? Mal, mas tem. E amanhã?
Você tem um Congresso? Corrupto, mas tem. E amanhã?
Você tem partidos políticos? Vendidos, mas tem. E amanhã?
Você tem emprego público? Viciado, mas tem. E amanhã?
Você tem salário? Miséria, mas tem. E amanhã?

Eu não tenho mais paciência para o conformismo. O que é clichê não me comporta. Ficar no disse-me-disse, no faz-de-conta, no oba-oba, é um saco! Como disse meu amigo e pastor: “fechar os olhos é um horror!”. É o “ó”. Devemos refletir sobre as idéias as quais defendemos, sem a preocupação de reproduzir as lições de advoguês aprendidas na aulinha do primeiro período da universidade. O Brasil é coisa séria. É uma comédia trágica, que faz a gente rir porque dói, porque sofre, porque mata.

E hoje, quando eu poderia estar enlutado com meus colegas pela luta contra a AIDS, tive que gastar minha uréia na Internet refletindo sobre uma guerra civil que não existe, quando o que existe de fato é uma realidade dura e cruel, da qual ninguém, em absoluto, ousou discutir no dia de hoje lá onde eu trabalho. Porque onde se costumava fazer a diferença, passou a proferir-se a parcimônia. Que saudades do Abraço contra a AIDS! Era um grande evento, que ocorria todo ano naquele lugar. Mas justo hoje, primeiro dia da semana, redondinho, segunda-feira, dia primeiro de dezembro, lá no meu trabalho, nada... somente o silêncio do cinismo, da mesmice, do fechar os olhos, interrompido apenas por quem, não sabendo urinar, defecava da boca conceitos fétidos, limitados e clichês.

sábado, 29 de novembro de 2008

Fobia



Essa postagem eu recebi de uma lista de um grupo de e-mails. Não sou eu o autor, mas a atriz Lúcia Veríssimo. Acho que vale a pena reprodu
zir, pois sua importância e relevância falam por si. O link para a postagem original é: http://bloglog.globo.com/blog/post.do?act=loadSite&id=12539&permalink=true#
Espero que gostem!

FOBIA

Apesar de adorar todas as cores e agradecer ao todo poderoso poder enxergá-las, tenho maior preferência pela cor azul, principalmente o azul marinho e o turquesa. Para mim, tanto faz a chuva ou o sol. Consigo enxergar a beleza em qualquer uma das situações. Me dedico a natureza como um ente querido. Procuro ajudar a todos ao meu redor. Sou verdadeira, corajosa, destemida e leal. Leal aos meus amigos e mais ainda aos meus sentimentos, pensamentos e desejos. Acredito em Deus e tenho fé. Sou completamente devotada aos animais.


E você também gosta do azul ou gosta mais do verde?
Amarelo, ou mesmo do lilás?
Devo odiá-lo ou criticá-lo por isso?
Vou sentir medo porque você não gosta da mesma cor que eu?
HOMO do grego HOMUS, quer dizer igual, semelhante.
FOBIA = aversão. Também proveniente do grego PHÓBOS que quer dizer pavor.
Vou um pouco mais adiante com essa FOBIA, é a designação genérica das diferentes espécies de medo mórbido e s
egundo o Aurélio, horror instintivo a alguma coisa; aversão irreprimível.
AVERSÃO – ódio, rancor, repugnânci
a, repulsa.
Só de escutar essas palavras acima: ódio, rancor, repugnância, repulsa, a mim causa arrepios, no mau sentido.
MÓRBIDO – enfermo, doente, como explica
o dicionário etimológico de Antônio Geraldo da Cunha e também no Aurélio = frouxo. Engraçado, não? Frouxo.
Sábias palavras de F. D. Roosevelt (Presidente dos EUA entre 1882 – 1945) "A única coisa que devemos ter medo e do próprio medo".
A verdadeira moral, zomba da moral, que é sem regras. E moral defende a observância estrita de princípios da moral estabelecida. Estabelecida por quem? Sobre que critérios? Em que época?
AMOR – Sentimento de inclinação e de atraç
ão ligando os seres uns aos outros, a Deus e ao mundo, mas também o indivíduo a si mesmo.
Para o Aurélio, Sentimento de dedicação absoluta de um ser a outro ser ou a uma coisa; devoção extrema, sentimento terno ou ardente de uma pessoa por outra, e que engloba também atração física, afeição, amizade, carinho, simpatia, ternura, muito cuidado; zelo.
Enfim, esse é o sentimento mais precioso e único. Capaz de nos traduzir como criaturas de Deus. De nos conectarmos com o universo em toda s
ua dimensão.
Amor, seja ele de que forma for, pode fazer mal?
Por que sentir medo do amor que duas pessoas podem sentir?
Só porque não é da mesma forma como você, supostamente, ama?
Mas e se você gosta mais da cor vermelha e seu irmão da bege?
Por que você tem que convencê-lo de que a vermelha é que é a cor para ser amada?
Você consegue enxergar as cores com os olhos dele?
E se para ele o vermelho é muito forte e pod
e até incomodá-lo?
Mesmo que doa a seus olhos, você vai querer obrigá-lo a amar somente o vermelho?
Você já pensou que age assim porque sente medo do sentimento do outro e isso faz com que você repense o seu?
Conselho que uma vez vi darem a um jovem: "Faça sempre o que tem medo de fazer". R.W. Emerson (filosofo e poeta norte-americano, 1803-1882)
E sabe por que?
"Justamente aquelas coisas que provocam mais medo são menos temíveis". Sêneca (filosofo latino, 4 a.c – 65 d.c.)

E não esqueça que: "O medo segue o crime e é seu castigo". Voltaire (escritor e filósofo francês, 1694 – 1778).
E por falar em crime, está sendo estudado o Projeto de Lei 5003/2001 que vai se tornar o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122/200
6, que propõe a criminalização da homofobia.
Se você acredita que qualquer forma de amor vale a pena, se você acha que os seres humanos devem ser livres para escolherem seus pró
prios caminhos e se quiser apoiar essa lei, visite o site http://www.naohomofobia.com.br/lei/index.php, leia sobre ela e assine.



quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Da Importância do Descarte


Esses dias eu me deparei com uma situação no mínimo emblemática. Isto porque, penso eu, as pessoas se chocaram com as coisas que disse sobre o "Descarte". Quando eu digo "pessoas" é apenas pretexto para se referir no geral a uma no específico. Mas vamos lá. O que tanto chocou no meu discurso?
Uma vez me disseram que eu trato das coisas como "descartáveis", e eu fiquei me perguntando por quê. Queria entender essa visão que pairava sobre mim. De fato, aos poucos fui compreendendo um pouco mais sobre o meu eu, e me chocando às vezes com algum lado muito superficial e fútil de mim mesmo... Entretanto, hoje faço uma outra leitura e entendo sob um outro prisma o que seria "descartar".
Vamos ao Aurélio! Descartar é "rejeitar (a carta de baralho que não serve); jogar fora após o uso; livrar-se de pessoa ou coisa importuna", como a urina, por exemplo, que sai simplesmente porque já não serve mais para o corpo (que não me leiam os urinoterapeutas!). Automaticamente me perceberam como pela segunda definição. Talvez seja, mas há outras formas de se pensar a questão.
Penso que uma das maiores dificuldades do ser humano, sobretudo dos brasileiros, é a capacidade de escolher. Nosso povo é um povo tradicional, que gosta do tradicional, um povo extremamente marcado por símbolos, ícones, simpatias, apetrechos e tudo o mais. A gente se apega aos detalhes, aos papeizinhos de bala, às cartas de amor que escrevemos ou que escreveram pra gente, ao primeiro presente, ao primeiro sutiã, ao primeiro tudo!!! Quantos de nós não guardamos ainda as primeiras lembranças da adolescência, as roupas de criança, os brinquedos... é muito difícil nos livrarmos do nosso passado material, não é verdade? Na verdade nem sei se devemos. Eu mesmo tenho coleções de lembranças materiais no meu quarto: de fotos a adereços de carnaval, de livros a cartões de natal, de notas fiscais a boletins do Ensino Fundamental! Quanta gente, por outro lado, também não carece dos livros que guardamos, quantas crianças também não precisam dos brinquedos com os quais não brincamos mais? Mas nosso medo de nos livrarmos do material acaba prevalecendo, mascarando o medo de perdermos aquilo que ele representa. Buscamos eternizar através do material um sentimento ou uma experiência que jamais se repetirá. Experiência só é experiência se for diferente. Do contrário, é mesmice.
Se é difícil nos livrarmos do material, daquilo que se deteriora à simples vontade humana (de rasgar, queimar, de levar ao lixo ou doar a outrem), imagine o quão difícil é se livrar do passado imaterial não-produtivo! Quando nós escolhemos o novo, quando optamos por um caminho, devemos ter consciência que deixamos para trás outros caminhos possíveis, outras possibilidades, e que a escolha NECESSARIAMENTE implica no descarte. Por este ângulo, "descartar" é tão importante quanto escolher. Descartar implica em selecionar, em deixar para trás aquilo que já não mais é construtivo, e seguir o rumo em busca do melhor, do sonho, da felicidade. A gente se apega aos caminhos antigos com medo de não alcançar os novos, porque nos falta sonhar. Nós, brasileiros, somos pouco acostumados a acreditar nas nossas conquistas, nas nossas vitórias, em um Novo mais digno. Um povo tão sofrido, não é de se estranhar. Um povo com tanta euforia sufocada, com tanta expectativa frustada...
No dia-a-dia, esse temor se traduz no receio em se desligar do passado, com medo de perder o que de melhor nele houve. A consequëncia direta é acumularmos uma bagagem enorme do que chamei de "quinquilharia". E não pensem que sou um consumista fútil e fanático quando digo que muito do nosso passado é quinquilharia, porque não é por aí. Quinquilharia é aquilo que trazemos na bagagem da vida, e que não serve para absolutamente mais nada, a não ser para lembrar de um passado por um motivo qualquer. Ora, o que do passado acrescenta, que soma, que contribui, jamais será esse tipo de bagagem. O passado que constrói é, conforme as palavras de uma pessoa muito especial, "as marcas na nossa pele, o sangue que corre nas nossas veias". É ex-pe-ri-ên-cia! É uma lembrança do que tivemos, um referência para que busquemos algo melhor no futuro. Quinquilharia é querer reproduzir esse passado no futuro; é fazer igual; é eternizar a lembrança, não relegando a ela o seu devido lugar no passado; é a não-experiência; é, enfim, o retrato da dificuldade em não descartar. É pegar o "morto" do baralho e ficar com ele até o fim do jogo, até o fim da vida. Os jogos têm muito a nos ensinar... é a metáfora do jogo da Vida.
Até quando durarão nossos receios em descartar coisas, pessoas, momentos, situaçãoes, problemas? Será o medo de nos rotularem como superficiais demais, aqueles que tratam pessoa como lixo, usam e jogam fora (conforme a segunda definição do Aurélio)? Se tomarmos essa definição como única, até concordaria... mas, jamais esqueçamos, a palavrinha em questão é polissêmica, e traz um novo sentido se aplicada à nossa vida. Entendo "descartar" como o significado diametralmente oposto de "optar". É um sinônimo às avessas. É como claro e escuro, vida e morte. Não existe um sem o outro. Não descartar significa também não optar. E pessoas que não escolhem, não optam, correm o sério risco de querer abraçar o baralho todo e morrer com o "morto" na mão. Quem não escolhe o seu caminho, é levado pelos caminhos dos outros. No final, poderá ser tarde reclamar de se ter chegado no lugar não desejado, que estará longe, muito longe, da Felicidade.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Da Teoria da Criação


No princípio era o verbo, mas o verbo não conseguia sair da cabeça e se materializar nos pixels do computador. De tanto insistir, o verbo enfim saiu. Saiu curto, simples e objetivo: SAI! Eis o verbo! Mas o que saía do "sai"? Nada saía. Foram um pacote de biscoito, duas caixinhas de suco, uma de chocolate ao leite, três copinhos de café, dois de água e uma latinha de refrigerante. Até que a Bexiga, não agüentando o excesso de líquidos, pediu ao corpo o alívio para dentro de si. Desta forma, acalentada pelo desconforto, foi que a idéia deste diário eletrônico surgiu, um incômodo que latejava entre a pélvis e o abdome, como que informando o quanto era necessário aliviar as tensões do dia-a-dia, compensar a pressão do caos urbano em que vivemos, e aquecer os laços de amizades ora reais, ora quase reais, ora surreais. Foi assim, no calor das águas quentes de um amarelo-âmbar que, finalmente, o verbo pôde ter um complemento, a urina, o veículo de expiação da pressão nossa de cada dia.