quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Eu, robô


Hoje lembrei que tinha um blog e que este servia para espiar o estresse, conforme proposta assentada em sua criação. Esqueci mesmo que possuía um veículo para espiar minhas angústias, anseios, indignações. Fazia tempo que não passava por aqui. Então resolvi escrever.

Os dias têm passado como se eu os estivesse assistindo e sem deles participasse. Não estou bem. Às vezes até me envergonho ao dizer que não estou bem, posto que existe um mundo imenso lá fora de repleto de pessoas famintas, miseráveis, sem teto, mendicantes, doentes, mortas. Mas não posso negar o vazio, não dá. Eu vejo os dias passarem e a sensação que eu tenho é a da imobilidade. Há mais de um mês estou em greve e, de alguma forma, os agitos da sala de aula estão me fazendo falta. Meus alunos são o demo! Gritam, são rebeldes, abusam da boa vontade do professor... mas são meus! E eu confesso que estou morrendo de saudades deles. Meu outro trabalho é administrativo e quase não vejo gente, à exceção das pessoas com quem trabalho todos os dias, as mesmas pessoas, sempre. Meu trabalho aqui é a ilustração do que significa rotina. Não é que seja chato ou difícil, a questão é que está fácil demais. Não possui os desafios da sala de aula, dos quais tenho sentido falta. Tenho sentido falta de ter o controle da situação, de escolher caminhos, de ser provocado e ter meios para driblar ou reagir à provocação. Aqui estou me sentindo amarrado pela facilidade, pela via fácil, pelo ofício simples. Cadê o Léo crítico, audacioso, sagaz? Estou cercado por gente bacana. Por muitos colegas legais. Bacanas e racistas. Legais e machistas. Isto tem me feito mal. Não, não se diferem da grande maioria da população. Tal como na sociedade lá fora, o racismo aqui é naturalizado. O machismo é quase um baluarte. Estou ficando sem forças para discutir, tenho andado desanimado, desacreditado da mudança. Hoje um colega criticou o SUS por oferecer cirurgia de mudança de sexo às transexuais, e sua crítica soou tão natural para todos os presentes... e eu não me perdoo até agora por não ter falado nada, absolutamente nada.

Elaboro documentos, digito atas, conserto erros, altero sites, leio e-mails, faço o que tenho que fazer, e sei que faço bem. Mas não estou bem! Estou cansado de cumprir ordens sem questionar! Não sou pau-mandado. Não quero me tornar um escravo do sistema perito em ser eficaz. Não! Onde está a poesia? Alguém viu o meu humor? Estou ficando sem combustível. Ontem fiquei pensando em quando poderia me dedicar ao teatro integralmente; sonhei com isso, e me entristeci ao acordar para a minha realidade mecânica. Estou com medo de me robotizar, de me tornar um servo do sistema, um produto automático que faz coisas automáticas para um mundo automático. Não suporto mais dar respostas mecânicas a processos burocráticos! As dúvidas simples demais de pessoas simples demais estão me irritando profundamente! Eu preciso de um mundo mais colorido, mais diverso e mais criativo! Definitivamente eu não combino com burocracia! As tintas para pintar meus quadros estão compradas há mais de um ano. Não me faltam ideias para as telas! Hoje vi fotografias de ondas com um colorido inimaginável, pensei que estampariam belíssimos quadros, mas apenas pensei. As ideias não se concretizam! Meu mestrado até agora não sai, e nem mesmo sei se teria tempo, nas atuais circunstâncias, de me dedicar aos estudos acadêmicos.

Estou às vésperas de ingressar em outro trabalho, um outro posto que exigirá de mim aquilo que me anima, que me traz vida: o ato de educar. Mas a dúvida me sobrecarrega. Olho para todos os lados e tudo que vejo em relação ao magistério são sombras. Sombras de descaso, de falta de investimento, de depredação, de deboche do poder público. Por outro lado, até hoje é no magistério onde encontro a maior possibilidade de lutar por aquilo que acredito, sem constrangimentos. Na sala de aula, eu sou o cara! Não estou me gabando, nem me achando o melhor professor do mundo, não. Mas lá, sim, eu posso. É como se lá eu realmente acreditasse que meu discurso vale à pena. Lá o desafio é mais excitante. Não existe comodismo, nem tarefa fácil. Cada dia é um novo dia, e se tem uma coisa que não consigo fazer lecionando é me automatizar.

Não sei se é essa a explicação pro vazio que estou sentindo essa semana. Mas sei que a explicação reside na automatização da vida. Enquanto isso, tentarei acalentar o coração. Chegar em casa e achar graça no café, no sofá, na cama. Ou quem sabe, trazer novas flores pro meu jardim. O verde há de trazer esperança e alegria! Meu jardim hoje está cinza e tudo o que eu mais quero é florescer.


3 comentários:

  1. Léo, estranhamente te entendo.
    Tem épocas que tudo fica cinza, sem graça.
    Mas, você mesmo deu alguns caminhos.
    Trazer graça e cor podem te ajudar a seguir mais um pouco.
    Particularmente não curto verde, prefiro azul... mas esverdeie seu dias... antecipe sua primavera e encerre esse inverno que não está fazendo bem.
    Se não dá para fazer exatamente o que queria (teatro, mestrado), tente colorir sua rotina.
    Suas piadas me faz bem e acredito que aos outros também.
    Então, mãos a obra. Força para continuar fazendo diferença aos seus!
    Um abraço e forma, guri dos olhos comprados! ^^
    Max

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  2. Leozinho, meu dindo lindo, te entendo pra caramba... Sei do que vc está falando e sei tb que é só uma fase, pois o Pai do Céu ainda te dará muitas oportunidades de compartilhares com o mundo teus talentos e dons.
    Saudade dos velhos tempos...
    Novos ventos soprarão.
    Falando nisso, e o Menino Lilás? rsrsrs

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  3. Eu entendo tudo isso, e, infelizmente, minha resposta não é muito positiva. por que, comigo, foi igual, foi indo, indo as coisas iguais e todo um sistema que eu não acreditava mais e eu um dia rompi com tudo... mas, claro, não é uma receita. Eu pude romper com tudo por que na verdade não tinha nada. Então, fica fácil. Mas vejo em você tantos recursos intelectuais e estruturas que sei que você vai se reinventar e encontrará um tanto mais de paz e felicidade.
    Não liga, talvez eu ande triste demais, brigas demais ao ver até militantes LGBT's defendendo a censura, em nome de um "bom senso" que eu acho relativo, as pessoas se esqueceram de serem um pouco mais malcriadas na vida, são cordatas, mas o cordato não muda e não avança. Quero que fique bem, Léo! Abração!

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